A HISTÓRIA DO HOMEM NO CRISTIANISMO - Parte 1

06/05/2013 12:43


Jesus, em seu profundo conhecimento da humanidade terrena, já sabia que, quando os homens tomassem para si as rédeas da condução dos destinos dos ensinamentos evangélicos, outros interesses menos nobres iriam interferir nos conceitos puros, altamente espiritualizados que Ele nos trouxe, maculando-os.

Daí a necessidade de lembrar aos homens a pureza original do Evangelho, da necessidade de afastar os interesses materiais, a vaidade, a ambição e outras coisas, todas menos nobres, que afogaram o espiritualismo puro que Ele veio trazer aos habitantes do planeta.

Mas, afinal, como ocorreram as transformações que macularam o cristianismo primitivo? Elas foram lentas e ocorreram pouco a pouco durante a história.

Em princípio os apóstolos mantiveram o Evangelho exclusivamente para uso dos judeus. Só após o Conselho de Jerusalém, no ano de 49, quando Paulo propôs que o Evangelho fosse divulgado, não só entre os judeus, mas também para todos os povos do planeta, o cristianismo iniciou sua expansão pelo mundo.

Com o crescimento surge o primeiro problema. Os cristãos de origem judaica achavam-se superiores aos demais.

Queriam obrigá-los a praticar a circuncisão, o que significava quase uma exigência de conversão ao judaísmo para depois poder ser cristão. Como se o cristianismo fosse uma seita judaica.

Após alguma discordância prevaleceu o bom senso e Pedro aceitou os princípios defendidos por Paulo. Ficou reconhecida a igualdade entre todos os cristãos.

Havia um fator externo, muito forte, que impedia os cristãos de se desunirem ou pensarem em coisas de menor valor: a perseguição religiosa.

A primeira conhecida, de grande vulto, foi no ano de 64. Houve um incêndio em Roma que ficou destruída em grande parte, dizem que por ordem do imperador Nero. Para aplacar a revolta da população, Nero acusou os cristãos de autores do incêndio e iniciou a série de barbaridades que todos conhecem.

Outras perseguições ocorreram posteriormente, mas a mais cruel foi a comandada pelo imperador Diocleciano que queria acabar com o cristianismo matando até o último dos seus seguidores.

Seu sucessor, Galério que governou no período de 293 a 311, também fez perseguir os cristãos nos anos de 303 e 304, foi a última vez que ocorreu uma perseguição organizada aos seguidores de Jesus. Pouco antes de morrer em 311, Galério assinou o chamado Édito de Galério, estabelecendo a tolerância religiosa.

Terminou assim a perseguição aos seguidores de Jesus.

Por incrível que possa parecer a perseguição foi motivo de união e manutenção da pureza religiosa cristã.

No ano de 307, Constantino assumiu o governo da Gália e o comando das legiões ali sediadas.

A política de Roma era vacilante. Desde a morte de Diocleciano, que resultou na divisão do império, faltava força ao governo imperial.

Então, Constantino resolveu ocupar Roma e assumir o governo.

A frente de suas tropas iniciou a marcha sobre Roma.

Consta que, na véspera de um combate, Constantino teria sonhado que viu no ar a figura de uma cruz e nela as palavras “in hoc signo vincis”, que quer dizer: “com este sinal vencerás”. Desde então adotou a cruz como estandarte e no dia 28 de outubro do ano de 312, enfrentou o exército de Maxêncio que tentava impedir sua arremetida, venceu e entrou triunfalmente em Roma.

No ano seguinte, 313, pelo Édito de Milão, Constantino decretava a liberdade de culto para os cristãos.

Durante a primeira época do cristianismo não havia nada de semelhante às leis e aos elementos que posteriormente serviriam de base à igreja. A unidade resultava apenas do acordo espontâneo dos seus seguidores.

A cristandade era pura democracia espiritual, como deveria ser hoje os segmentos religiosos cristãos.

Sem um dirigente oficial, a hierarquia era muito relativa, o bispo de Roma não possuía mais poderes que os outros, sem meios de coação externa, sem relações temporais com o Estado.

A própria afirmação de que a autoridade do bispo de Roma vem de Pedro, que teria sido o primeiro bispo de Roma, é discutível. Em nenhuma passagem do Novo Testamento, em Atos dos Apóstolos ou das Epístolas, há qualquer citação referente a presença de Pedro em Roma. Teria sido papa de 42 a 67. Entretanto, só após o ano de 49, por proposta de Paulo, é que o cristianismo começou a ser pregado a todos os povos. Pedro estava em Jerusalém em 49 e só pregava para comunidades judaicas. Ainda que porventura tivesse ido até Roma como lã não havia comunidade judaica, não seria na condição de bispo, nome que os primeiros cristãos davam aos dirigentes de assembleia.

O inventor dessa lenda foi Dionísio de Corinto, que, 100 anos após a morte de Pedro e sem firmar-se em qualquer documento, escreveu falando das pregações de Pedro em Roma e do falecimento do mesmo naquela cidade. Essa invenção levou, posteriormente (no século II), o bispo de Lion chamado Irineu a afirmar que a fundação da igreja romana foi feita pelos dois apóstolos, Pedro e Paulo. E, ainda, que a concessão a Lino do título de bispo teria sido feita pelos dois.

Se Pedro fosse bispo de Roma, a não ser que renunciasse, não poderia conceder esse título para outro.

Paulo jamais citou Pedro como bispo de Roma. Na sua Epístola à igreja (assembleia) daquela cidade, saudou por seus próprios nomes a 27 dos principais colaboradores do seu apostolado e não se referiu àquele outro apóstolo. Se Pedro fosse bispo de Roma esse silêncio seria uma tremenda descortesia, um desacato que Paulo, certamente, não cometeria.

Em Atos, capítulo 15, versículo 5 a 7 observa-se que no período citado como do apostolado romano de Paulo, esse, na verdade, encontrava-se em Jerusalém, indo depois morar na Antioquia, onde Paulo lhe dirigiu censuras por transigência no apostolado (Gal. 2:2 e seguintes). Na mesma epístola em 2:7 e 8, Paulo deixa bem clara a divisão de tarefas entre ele e Pedro quando diz: “... o evangelho da incircuncisão me estava confiado, como a Pedro o da circuncisão. Porque aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão esse operou também em mim com eficácia para com os gentios.” Cada um tinha seu trabalho. E Paulo nunca reclamou de Pedro ter entrado em sua tarefa.

O admirável Rui Barbosa, na introdução que escreveu para a edição em português do livro O Papa e o Concílio, de Janus, é claro em sua revolta quando se refere às modificações e concessões feitas no cristianismo a partir do Constantino.

Acredito que esta introdução é única. A obra de Janus possui 324 páginas, a introdução 332, sendo, portanto, 8 páginas maior que o livro. É preciso também dizer que é mais esclarecedora.

Vejamos um trecho:

“Havia simplicidade, ausência de cerimônias teatrais, severa proibição de imagens, pureza de ensino. Nos dias de Constantino, porém, passou a igreja por uma revolução. Começou o cesarismo religioso. Sacrificou-se o cristianismo ao engrandecimento da hierarquia. O imperador (não batizado) recebe o título de bispo exterior; julga e depõe bispos; convoca e preside concílios; resolve sobre dogmas. Já não era mais a igreja dos primeiros cristãos. Adquiriu poder temporal, mas sua autoridade moral decresceu.

De perseguida passa a perseguidora. Buscou riquezas e corrompeu-se, derramou sangue e sujeitou o espírito à letra.”

 

Não há dúvida de que o grande tribuno baiano estava coberto de razões.

 

REFERÊNCIA

PINTO, Hélio da Silveira. Já Estava Escrito. 2ª edição – ampliada e revista. ARC Editora: São Paulo, 2003.